A redução dos níveis de uma proteína chamada tau, mais conhecida por seu envolvimento na doença de Alzheimer, ameniza as características do autismo em camundongos, de acordo com um estudo publicado no periódico Neuron (1).
A abordagem atenua comportamentos semelhantes ao autista em dois modelos de camundongos com mutações na mesma via de sinalização celular, mas não em um terceiro modelo no qual a via não é afetada. Os resultados sugerem que definir a proteína tau como alvo para terapias medicamentosas pode tratar apenas algumas formas de autismo.
“Existem certas intervenções terapêuticas que podem ser úteis para alguns tipos dessa condição (autismo) e podem não funcionar em outros”,
diz o investigador principal Lennart Mucke, diretor do Instituto Gladstone de Doenças Neurológicas em San Francisco, Califórnia.
Os pesquisadores, já há algum, tempo consideram ligações entre distúrbios do neurodesenvolvimento, como autismo, e doenças neurodegenerativas, como Alzheimer, e o estudo é “evidência convincente” de que existe uma sobreposição, diz Nicola Grissom, professor assistente de psicologia da Universidade de Minnesota, em Minneapolis, que não estava envolvido na pesquisa.
“É uma pista importante de que o cérebro não segue esses limites estritos nos diagnósticos que as avaliações clínicas impõem”, diz Grissom.
Demonstrou-se que a redução dos níveis de tau previne convulsões e diminui problemas de aprendizado e memória em modelos de camundongos de uma condição chamada síndrome de Dravet (2).
Cerca de um terço das pessoas com essa condição infantil grave e às vezes fatal também tem autismo(3). Mutações em um gene relacionado ao autismo chamado SCN1A geralmente causam a síndrome de Dravet.
No novo estudo, Mucke e seus colaboradores criaram camundongos geneticamente modificados para eliminar ou cortar pela metade os níveis de proteína tau em três modelos de camundongo: aqueles com uma mutação SCN1A, aqueles com falta do gene do autismo CNTNAP2 e aqueles com uma mutação no SHANK3, um dos principais genes ligados ao autismo.
Nos camundongos SCN1A e CNTNAP2, a redução dos níveis de tau diminui significativamente comportamentos semelhantes ao autista, como auto-limpeza repetitiva e desinteresse social em outros camundongos.
A redução da tau também restaura o tamanho normal do cérebro: os camundongos SCN1A e CNTNAP2 têm megalencefalia, ou um cérebro aumentado, também observado em muitas pessoas com autismo. Mas camundongos com baixos níveis de tau têm cérebros de tamanho normal.
A redução dos níveis de tau não teve esses efeitos nos camundongos SHANK3, no entanto.
Para entender o motivo dessa discrepância, os pesquisadores procuraram vias de sinalização celular que funcionassem diferentemente nos três conjuntos de camundongos. Eles identificaram uma via conhecida como PI3K, que é hiperestimulada nos modelos de camundongo Dravet e CNTNAP2, mas não nos camundongos SHANK3.
O Tau regula um gene chamado PTEN, de acordo com um estudo de 2017(4). O PTEN é responsável por 2 a 5% dos casos de autismo e é conhecido por modular a via PI3K; sem ele, a via se torna hiperestimulada, em alguns casos levando ao autismo.
A equipe de Mucke descobriu que eliminar o PTEN nos neurônios bloqueia o efeito de diminuir a tau no comportamento dos camundongos.
É provável que Tau seja importante, mas não a história completa, diz Illana Gozes, professora emérita de bioquímica clínica da Universidade de Tel Aviv, em Israel, que não participou do novo trabalho. No ano passado, Gozes vinculou certas mutações à doença de Alzheimer e ao autismo. Muitas dessas mutações estão nos genes, incluindo a tau, que são importantes nos microtúbulos, que ajudam a formar a estrutura da célula (5).
A relação entre proteínas tau e microtúbulos provavelmente é a chave para a doença de Alzheimer e algumas formas de autismo, diz ela, embora não esteja claro como o trabalho se aplicaria no tratamento de pessoas com autismo.
“Eu acho que ainda temos muito a descobrir ”,
diz Gozes. “Mas, independentemente disso, é muito interessante porque a pesquisa coloca a tau e, na minha opinião, também os microtúbulos em um ponto central”.
Referências: